quarta-feira, 14 de maio de 2014

A lógica estranha dos EUA e da UE: o referendo do leste ucraniano não é democrático, mas o regime de Kiev, imposto através do golpe é?



Por Mahdi Darius Nazemroaya

GlobalResearch – 13 de maio de 2014.

D o n e t s k

Fraude. Farsa. Antidemocrática. Ilegal. Realidade alternativa. Credibilidade zero. Absurdo. É dessa forma e usando essas palavras que os Estados Unidos e países membros da União Européia se referem aos referendos de 11 de maio de 2014 no leste ucraniano. Em linguagem alarmista e russófoba, os EUA , União Européia e a OTAN culpam a Federação Russa pela organização da votação no leste ucraniano. A incompetente porta voz do Departamento de Estado dos EUA, Jennifer Psaki, contratada apenas pelo seu histórico nas campanhas do Partido Democrata e não por proficiência sobre relações internacionais ou assuntos externos, descreve o referendo realizado na região do extremo leste, em Donetsk e Lugansk, como sendo apenas uma repetição da “cartilha da Criméia” pela Rússia. Ela está só papagaiando o ponto de vista de seu chefe, o Secretário de Estado dos EUA, John Kerry.

William "vago" Hague

O Secretário do Exterior da Inglaterra, William Hague, declarou que os votos não tem peso e tem credibilidade zero e que “não cumprem as normas”. Ele anunciou que as votações no leste ucraniano “não cumprem as normas, mesmo as simples normas de objetividade, transparência, equidade e sequer foi conduzido como deve ser uma eleição ou referendo.” Acrescentou que os organizadores eram impostores fingindo atender vagamente as normas às quais se referiu. É por causa de seu reconhecido talento para a retórica vazia que o Secretário Hague ganhou o apelido de “William Vague” (“William Vago”). Sua forma vaga de definir as coisas é usada deliberadamente para desacreditar o processo democrático ocorrido no leste ucraniano.

Antes da realização do referendo, e dividindo o mundo entre nações “civilizadas” e “bárbaras”, John Kerry prometeu que nenhuma entre as nações “civilizadas” reconheceria o resultado da votação no leste ucraniano. O que o principal diplomata do staff americano pretensiosamente quis dizer com essa linguagem etnocêntrica e pondo a nu o desespero de Washington, é que os EUA e seus aliados representam a nata da civilização e que qualquer nação que não seguir os exemplos de Washington está saindo dos limites desses limites e seria, portanto, “não civilizada”. Os países “não civilizados” aos quais ele se referia são a Rússia e seus aliados e parceiros como a Armênia, Belarus, Venezuela, Cuba, Bolívia, Tadjiquistão e Irã.


Ódio é amor, guerra é paz e a Junta é democrática.

Que não se perca a ironia. Exatamente as mesmas palavras usadas pelo governo dos Estados Unidos e da União Européia para descrever a votação nos referendos do leste ucraniano se encaixam com precisão na descrição do regime liderado por Arseniy Yatseniuk que foi instalado pela força em um violento golpe apoiado pelos EUA em fevereiro de 2014. É flagrante o uso claro de dois pesos e duas medidas pelos Estados Unidos e seus aliados nas suas condenações aos referendos nas regiões de Donetsk e Lugansk. Quando, desta vez, um processo perfeitamente democrático ocorre de forma pacífica na Ucrânia, com o povo votando de verdade, os Estados Unidos e a União Européia irônica e comicamente declaram que o referendo “não tem legitimidade democrática”.

Pode se pensar o que quiser sobre a legitimidade dos referendos no leste ucraniano, mas tiveram grande apoio popular e alta participação. Os ucranianos do leste reuniram-se em massa em longas filas de votação, apesar de ter o regime em Kiev tentado usar táticas para amedrontá-los. Grandes multidões se reuniram para votar, mesmo que o regime não eleito de Yatseniuk e apoiado pelos EUA, o qual  incorporou oficialmente bandidos ultranacionalistas armados que executaram o golpe de fevereiro deste ano como parte do aparato militar e de segurança, e mandou essas milícias armadas para dentro das cidades a fim de interromper a votação. Acabaram por ferir ou matar vários civis desarmados neste processo, ao tentar interromper a votação, sob a alegação de uma “operação antiterrorismo” do regime apoiado pelos Estados Unidos.

Dizem que uma foto fala mais que mil palavras. Seguem-se fotografias que devem ser o suficiente para abafar todo o barulho que fazem os manipuladores de opinião instalados em Kiev e seus mestres em Washington e na União Européia.

  



O regime de Yatseniuk não apenas teve a audácia de questionar a legitimidade das autoridades locais no leste ucraniano, mas tentou também estabelecer ali uma espécie de lei marcial. Se o acontecido na Euro-Maidan foi sobre democracia e o direito de escolher líderes populares, por que os ucranianos do leste não podem escolher seus próprios líderes populares? Por que Yatseniuk e seu regime tentaram lhes impor pela força seus prepostos? Tudo isso é compatível com as palavras ditas por Yatseniuk, Timoshenko e sua corte?

EUA e UE sempre foram contra conceder poder real ao povo.

Não se pode esquecer que, questões de legalidade à parte, sempre que o autêntico “poder popular” está em jogo em lugares como o leste ucraniano, ou o Barein, e o povo comum está lutando por seus direitos, os Estados Unidos e a União Européia invariavelmente são contra, e apóiam tiranos opressivos à revelia da população. Não apenas os predominantemente pacíficos e desarmados cidadãos do leste ucraniano são chamados de terroristas por Yatseniuk e seus apoiadores, como os governos e a rede de mídia que dá apoio aos golpistas instalados em Kiev passaram a denominá-los como “insurgentes”. É uma manipulação deliberada do termo com o fito de equiparar todo o povo da Ucrânia Oriental a amotinados, o que justificaria a suspensão de seus direitos. Além disso, o uso do termo expõe a posição política e a opinião nas entrelinhas de quem o utiliza. Amotinado é quem se rebela contra a autoridade legítima. Não há autoridade legítima na Ucrânia.

Os transgressores flagrantes são a Junta de Yatseniuk e seus patrocinadores estrangeiros. O regime títere que ilegalmente ocupa os gabinetes do governo e seus supervisores em Washington e na União Européia não tem moral ou autoridade legal para pregar sermões sobre o referendo ou sobre democracia depois de assediar a Ucrânia e mutilar sua democracia.

A mídia ocidental, que tenta a todo o tempo minar a Ucrânia Oriental não consegue mostrar os fatos reais nem ali, nem na metade ocidental da Ucrânia. Tentam todos distorcer os fatos que aconteceram no leste ucraniano. Tentam ainda culpar a Rússia pelo incêndio que eles próprios atearam na Ucrânia, usando estes acontecimentos como uma justificativa para as suas reais intenções em longo prazo, de paralisar a Rússia e seus aliados, que agora estão surgindo.
São mentiras deslavadas sobre a votação no leste ucraniano, numa tentativa de desacreditá-la. Mesmo levando-se em consideração suas falhas e falta de uniformidade - que pode ser facilmente observada através das imagens do processo de votação - é extraordinário, ainda mais depois que o governo ilegal de Kiev tentou obstruir a votação, que a comunidade da Ucrânia Oriental possa ter organizado e levado a efeito os referendos. Voluntários usaram escolas e prédios públicos para o processo de votação.

Um dos truques sujos usados pelo regime de Yatseniuk foi bloquear o acesso das autoridades no leste ucraniano a censos mais atualizados e a listas de eleitores. Por esse motivo, as autoridades locais foram obrigadas a se valer de registros eleitorais mais antigos. O regime em Kiev também deve ser responsabilizado por essa falha e não apenas as autoridades locais da Ucrânia Oriental. Uma votação o mais justa possível foi impedida pelo regime da Junta de Yatseniuk. Apesar de ter a Junta em Kiev tentado obstruir a eleição, as autoridades locais fizeram o melhor trabalho possível na preparação do referendo. É um menosprezo aos ucranianos oponentes ao governo instalado por um golpe de estado em Kiev, assim como um insulto aos protagonistas independentes da questão, os comentários de que toda essa mobilização de milhões de ucranianos orientais foi responsabilidade do Kremlin. Só serve para eles mesmos a humilhante posição tomada pelos Estados Unidos e pela União Européia sobre a votação no leste ucraniano. Em Kosovo, na Sérvia, província predominantemente albanesa e onde não houve referendo, as posições da União Européia e dos Estados Unidos foram totalmente diferentes e eles reconheceram a independência da província sem qualquer consulta ou votação popular.

Os ucranianos do leste, tomando suas próprias decisões, querem dissociar-se do regime de Kiev, imposto pelo golpe. Que não se esqueça também dos ucranianos ocidentais. Na metade ocidental do país, muitos ucranianos estão reféns das milícias e demais forças que sequestraram sua república.

Madhi Darius Nazemroaya - Autor premiado e analista de geopolítica, Madhi Darius Nazemroaya é autor de The Globalization of NATO (Clarity Press) e de um livro a ser em breve lançado sobre a Guerra da Líbia e a recolonização africana. Também contribuiu para muitos outros livros com temas desde a crítica cultural até relações internacionais. É um sociólogo e pesquisador associado do Centro para Pesquisa sobre Globalização (Centre for Research on Globalization - CRG) e contribui com a Strategic Culture Foundation (SCF), Moscou, e membro do Scientific Committee of Geopilitica, Itália.

Tradução: mberublue



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